Por cerca de 20 anos, a sede da igreja Word of Faith Fellowship (Associação Palavra da Fé, em tradução livre do inglês), nos Estados Unidos, comandou duas comunidades no Brasil: uma em São Joaquim de Bicas e outra em Franco da Rocha, no Estados de Minas Gerais e São Paulo respectivamente. Integrantes da seita revelaram à “Associated Press” que eram frequentemente espancados para afastar supostos demônios e submetidos a regras rígidas, além de alguns deles terem sido escravizados no país norte-americano. Uma ex-integrante, Juliana Oliveira, de 34 anos, explica que os abusos começaram quando os americanos chegaram de Spindale, na Carolina do Norte. “Quando você está em uma seita, você não sabe que está em uma seita porque pouco a pouco isso se torna ‘normal’”, explicou. “É como um sapo em uma panela de água. Quando está fervendo, ele não consegue pular fora”. Ex-membros revelaram que, no Brasil, a igreja tinha regras rigorosas para todos os setores da vida. Era proibido vestir calça jeans, por exemplo, e crianças não podiam conversar com pessoas do sexo oposto sem aprovação. Na unidade de Franco da Rocha, os ex-membros também não puderam jogar futebol às vésperas da Copa do Mundo de 2014. “Nós acabamos de lidar com um grande ‘demônio do futebol’ que baixou no Brasil há duas semanas”, disse um dos fundadores aos integrantes nos Estados Unidos durante um sermãoAs crianças frequentavam a escola nas terras da igreja, que era protegida por cerca de 2,5 metros de altura com arame farpado por cima. Elas voltavam para casa em um bairro também isolado. “A influência de pastores americanos foi se tornando cada vez mais forte na escola e na igreja”, contou Oliveira. “Eles interromperam a ênfase no ensino de português, geografia, matemática – as coisas normais. E mudaram principalmente para o estudo da Bíblia e um monte de abusos.” A reportagem verificou que ao invés de sexualidade humana, livros didáticos ensinavam o ciclo de vida por meio de reprodução de vegetais. Um outro ex-integrante da seita, Flavio Correa, de 52 anos, disse que notou os abusos quando um dos seus filhos levou tantos tapas durante uma sessão que sofreu vários cortes no rosto. “Naquele momento eu pensei que era absurdo, exagerado”, contou. “Mas eu confiava neles e você começa a pensar que é bom para a pessoa. Hoje, eu só penso que é estupidez.” A igreja evangélica foi fundada em 1979 por uma ex-professora de matemática, Jane Whaley, e o seu marido, Sam. Um missionário americano casado com uma brasileira foi quem trouxe a seita para o Brasil no final dos anos 1970. Ele foi pastor em uma igreja batista próxima a Belo Horizonte. Martim e Sam teriam se conhecido em um avião, em 1986. O encontro levou o casal de Spindale a viajar para o Brasil para conhecer a igreja de Martin. Logo, os americanos tomaram controle da Verbo Vivo em Belo Horizonte. Em 2005, Martin mudou sua igreja para São Joaquim de Bicas, uma pequena cidade a cerca de 45 minutos da capital mineira. Foi então que dezenas de famílias da igreja se mudaram para um terreno em Betim, uma cidade vizinha. Os ex-membros afirmam que o objetivo era isolar o rebanho do resto do mundo. O grupo é formado por quase 2 mil membros em diversos países, incluindo Brasil, Estados Unidos, Gana, Suécia, Escócia e outros.