“Ninguém acredita, mas a gente tenta sobreviver”, diz Valdirene Porto, 51, a professora que perdeu mãe, pai, marido e dois irmãos para o coronavírus, em três semanas, de fevereiro a março deste ano, em Brumado. Tudo tão intenso que Valdirene nem conseguiu chorar a morte de todos eles. Viu as dores se atropelarem, sem viver uma por vez: “Num dia morreu meu pai, no outro, chegava a notícia que meu marido tinha morrido”. Com a dor, emagreceu 10 quilos.
As mortes aconteceram entre fevereiro e o início de março. Primeiro, foi a mãe de Valdirene. Depois, o pai, o marido e os irmãos – um deles, o mais novo, faleceu no dia em que completou 34 anos. “Não sei como estou sobrevivendo ao que estamos vivendo”, desabafa Val, como é chamada.
É ela quem, agora, se vê obrigada a resolver a burocracia resultante dessas perdas. “Estava com meu marido há 20 anos, somos pais de um menino de 14 anos, perdi meu porto seguro, sabe o que é isso?”, revela.
Pela manhã, ela sai da cama, depois de uma noite insone, e não encontra o marido. É um sinal que a lembra a devastação em sua família, que ainda não compreende o luto. “Ninguém acredita, mas a gente vai sobrevivendo”, repete Val, que pediu afastamento do trabalho como professora.
As esposas dos irmãos falecidos se viram com os filhos para criar, desempregadas. Os netos sem os avós.
Na dor de um luto em aberto, a mente de Val repassa perguntas: “E se tivéssemos feito isso? E se minha mãe não tivesse sido internada? E se meu pai tivesse fechado a mercearia? E se?”. O pai, José Luiz, era dono de uma venda, e, contrário às recomendações de alguns dos sete filhos, mantinha o espaço aberto.
“A vida”, completa Val, “deu uma guinada de 360 graus, mudou tudo”. O filho dela a pergunta porque o pai dele não teve alta. Val gostaria de responder, mas não sabe. Responder o quê, se ela faz a mesma pergunta em silêncio? “É uma dor que não passa”.