Há três anos, um post na rede social Tumblr com uma foto de um vestido passou a ser compartilhado ali e em várias plataformas online, gerando muita discussão: alguns viam a peça como se fosse azul-e-preta, outros com branca-e-dourada. O viral ganhou o nome de #TheDress e entrou na mira da ciência. A neurocientista Claudia Feitosa Santana, pesquisadora do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa (IIEP) Albert Einstein, foi uma das especialistas surpreendidas pelo fenômeno e que resolveu investigar o que estaria por trás dele. O trabalho de Claudia sobre o viral #TheDress acaba de ser publicado em uma edição especial sobre cores na revisa científica iPerception. Participaram da pesquisa 52 universitários com média de idade de 22 anos. Grande parte deles era da School of The Art Institute of Chicago (SAIC), nos Estados Unidos, onde Claudia deu aulas em 2016. Mas também havia estudantes de outras áreas, como a de biológicas. Os voluntários foram submetidos a uma série de testes. Um deles consistia em nomear as cores da famosa imagem do vestido, projetada numa tela. Em outro, chamado de color matching (identificação de cores), os participantes misturavam as cores únicas (verde, vermelho, azul, amarelo) num computador até chegarem aos tons que enxergavam no traje. Já no unique white settings (configurações de branco), eles voltavam a misturar as cores também por meio de um computador para alcançar o que consideravam ser o branco mais branco possível. O tom do grupo que via o vestido branco-e-dourado, por exemplo, era mais azulado do que o branco do grupo do azul-e-preto. “No teste de preferência de cores, verificamos que o grupo branco-e-dourado tem maior preferência por azul claro”
Ao analisar os dados, a neurocientista e seus colegas concluíram que a diversidade de percepção entre os grupos estava parcialmente relacionada ao cone S, receptor da retina responsável pelo processamento de ondas curtas de luz, justamente a faixa do azul. É a partir dessa leitura de luminosidade que a retina do olho envia informações para o cérebro para que as imagens sejam interpretadas. As alterações no cone S estão relacionadas com as diferentes experiências de exposição ao sol desde infância até o início da vida adulta.
“Em lugares mais frios, a luz é mais azulada”, explica a neurocientista. O cérebro das pessoas que nasceram nessas regiões dá uma espécie de desconto na leitura da luz azul e elas tendem a ver o vestido como branco-e-dourado. Por outro lado, quem nasceu em localidades mais quentes, com luz mais amarelada, geralmente enxerga a vestimenta como azul-e-preta.
Para a neurocientista, o estudo pode ajudar a compreender doenças como ansiedade e depressão. “Estudos de percepção de cor ajudam que a gente entenda melhor as influências genéticas e ambientais, e dentro das ambientais, as culturais e as individuais, porque também vão ajudar a estudar olfato, audição”. Claudia afirma que o foco principal não é o #TheDress em si, “mas como que esse lugar em que você vive pode influenciar a sua percepção e as suas preferências”.
A neurocientista explicou ainda que os estudos como esse ajudam a entender diversas doenças que afetam a percepção de cores. “Muitas doenças afetam a percepção de cores, como o diabetes, intoxicação por metais pesados, esclerose múltipla, Mal de Parkinson, entre outras. Qualquer doença que afeta o sistema visual também afeta a percepção de cores, então a gente também usa a percepção de cores para tentar entender melhor o desenvolvimento dessas doenças”, finalizou.