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8 de janeiro de 2018
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Com doença degenerativa, general diz ter forças para comandar Exército

Imagem Reprodução

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No comando do Exército Brasileiro e à frente de 215 mil homens dos quais é exigido pleno vigor físico, o general Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, 66, depara-se com dilemas de acessibilidade, precisa de apoio para atividades e pensa todos os dias até quando irá conseguir resistir ao poder da doença degenerativa grave que o acomete. Embora o militar não diga o nome da enfermidade, nem mesmo em suas postagens em redes sociais, as características de sua doença se aproximam da esclerose lateral amiotrófica (ELA), mundialmente conhecida pela campanha do balde de gelo que arrecadou fundos para pesquisas. Existem, porém, outras doenças que acometem os neurônios motores. Villas Bôas tem perda de mobilidade e já é visto em cadeira de rodas e também tem problemas respiratórios. “O que está em pé e muito vivo hoje é minha mente, além dos princípios e valores aprendidos no Exército desde a minha adolescência”, diz. Sua condição atual o fez ampliar debates de inclusão dentro das Forças Armadas. Os colégios militares estão passando por reformas de adequação de acesso, e professores estão sendo treinados para promover educação inclusiva, o que deve estar totalmente pronto até 2023. Sobre pessoas com deficiência desempenhando funções militares, o general avalia que é possível aproveitar potenciais, mas que mais estudos precisam ser feitos. General desde 2011 e comandante do Exército desde 2015, Villas Bôas não pretende deixar o cargo. “É possível manter o padrão de profissionalismo e entusiasmo mesmo enfrentando grandes

PERGUNTA – O Exército exige perfeita condição física e sensorial. A nova condição do sr. provocou reflexão sobre isso?

EDUARDO VILLAS BÔAS – Neste momento nos aproximamos mais de Deus e da família. Além disso, tenho recebido apoio de todos dentro da Força. Os amigos têm um papel muito importante nestas horas, e, neste caso, a carreira militar tem uma grande vantagem, pois a camaradagem é uma marca da profissão.

Temos pessoas dentro da caserna que são mais ligadas a nós do que algumas pessoas da nossa própria família e constantemente nos prestam apoio e incentivam. Tudo isso me incentiva a superar as exigências físicas da minha profissão. A reflexão que faço diariamente é até quando poderei seguir trabalhando. Enquanto estiver colaborando para que o Exército possa seguir cumprindo suas missões constitucionais, permaneço.

P. – Pessoas com deficiência não poderiam dar alguma contribuição ao país? O Exército poderia ser mais inclusivo?

EVB – O Exército já tem um projeto na área do ensino. Temos alunos com necessidades especiais que foram admitidos recentemente em nossos colégios militares. Em 2017, dois colégios, de Brasília e de Belo Horizonte, realizaram o concurso de admissão com reserva de vagas para alunos com deficiência. Até 2023 queremos que todas as unidades estejam recebendo esses jovens. Em Brasília, estamos capacitando pessoas, fazendo cursos de especialização e formação específica em educação inclusiva. Estão sendo feitas reformas de instalações, construção de rampas, adaptação de banheiros e colocação de sinalizações táteis.

Além disso, estão sendo criadas salas com recursos multifuncionais para alunos com altas habilidades ou deficiência, com tecnologia de apoio e jogos pedagógicos que potencializam a aprendizagem do aluno e facilitam a compreensão de conhecimentos.

Com relação a ser mais inclusivo, o Exército tem procurado através de sua política de pessoal aproveitar todo nosso potencial humano. É fato que uma ou outra limitação não impede o indivíduo de ser aproveitado em outra área. Mas é preciso que a Força conduza mais estudos sobre o aproveitamento de pessoas com algum tipo de deficiência.

P. – É desafiante comandar 215 mil homens em uma condição física diferente, sem poder, por exemplo, ficar em pé?

EVB – Estou participando das atividades, mesmo com limitações, pois durante toda a carreira sempre gostei de estar presente em tudo. O que está em pé e muito vivo hoje é minha mente, além dos princípios e valores aprendidos no Exército desde a minha adolescência. A carreira, a vibração como militar e o contato com a tropa é o que me motiva. Sempre que puder, enquanto tiver forças, vou estar presente, encarando cada dia como um novo desafio.

P. – Por que decidiu seguir em frente no comando? Sente-se de alguma forma um exemplo?

EVB – A decisão de permanecer não coube só a mim, pois o presidente da República é quem define o comandante do Exército. Coloquei meu cargo à disposição, mas ele [Michel Temer] achou por bem que eu deveria permanecer no comando.

Nossa carreira sempre é repleta de desafios. Não esperava, ao final da minha carreira, enfrentar este tipo de problema. Creio que, após tudo isso, ficará claro para todos os nossos militares que é possível manter o padrão de profissionalismo e entusiasmo mesmo enfrentando grandes dificuldades pessoais. Sabemos que todos enfrentam problemas, até piores do que o meu, mas não podemos perder a fé e a vontade de lutar por aquilo que acreditamos. Temos incorporado ao nosso juramento a frase ‘com o sacrifício da própria vida’.

Estou defendendo os interesses do país fazendo exatamente isto. Creio que, dessa maneira, este meu momento pessoal pode servir de motivação para os jovens e para aqueles que amam esta profissão.

P. – Chateia o impedimento de não conseguir desenvolver atividades práticas ou participar de cerimônias formais?

EVB – Não tem coisa melhor para o militar do que participar de exercícios militares e das formaturas, principalmente nas escolas de formação. Ainda consigo participar de algumas e isso contribui como um importante estímulo e fonte de motivação, para o meu prosseguimento na missão.

Por outro lado, participo orientando, emitindo diretrizes, motivando, liderando como comandante do Exército. De igual forma, tenho procurado ser ativo nas redes sociais e, com isso, aproximo-me mais dos militares e de todos que desejam saber qual a posição da força terrestre em diversas questões.

P. – As Forças Armadas poderiam contribuir para melhores condições arquitetônicas do país?

EVB – O tema acessibilidade é importante e deve ser discutido pela sociedade. Só pode ser resolvido com um amplo debate envolvendo os poderes constituídos e o cidadão. O Exército sempre estará à disposição para contribuir, mas não tem atuação direta para mudar infraestruturas.

Exemplo disto é o trabalho da nossa engenharia, que tem contribuído para o desenvolvimento do país, construindo estradas, participando de obras de infraestrutura. Em seus projetos, procura levar em consideração as questões relativas à acessibilidade.

As Forças Armadas têm atuado em demandas sociais e isso aumenta a vulnerabilidade dos soldados. É adequada a proteção assistencial aos homens que, eventualmente, se ferem com gravidade?

Na maioria das operações, o militar atua em condições de risco. Com o aumento do emprego das tropas em missões reais, a vulnerabilidade aumentará na mesma proporção. O Exército possui mecanismos que amparam o militar e sua família caso aconteça algum acidente em serviço ou em operação.

Em minha diretriz de comando determinei que a família militar e a saúde sempre tivessem prioridade.Além disso, nosso sistema de saúde é capacitado e bem aparelhado, contando com quadros bastante habilitados para tratar o militar assim como sua família.

P. – O senhor fala com otimismo sobre o controle de sua doença. Qual o estágio dela hoje?

EVB – Fui acometido por uma doença degenerativa do neurônio motor. Ela atingiu alguns grupos musculares. Estou com dificuldade para caminhar e com alguma dificuldade respiratória, porém isto não tem me impedido de participar de todos os assuntos relativos ao comando da Força. Tenho uma rotina de fisioterapia, medicamentos e consultas periódicas que, no momento, não tem atrapalhado o desempenho da minha função. O tratamento ajuda a gerenciar os efeitos colaterais que a doença me traz, de forma a não gerar maiores consequências para os trabalhos que devo desempenhar.