Em sua primeira disputa eleitoral, o empresário Romeu Zema Neto (Novo), 54, foi eleito governador de Minas Gerais neste domingo (28), alcançando a principal aspiração do seu partido, a de tirar grupos polÃticos tradicionais do poder. Ele aproveitou a onda nacional de Jair Bolsonaro (PSL) e derrotou PT e PSDB, até então as principais forças polÃticas do estado.
Com 74% das urnas apuradas, Zema tem 71,28% dos votos válidos, contra 28,72% de Anastasia.
O senador e ex-governador Antonio Anastasia (PSDB), 57, que disputou o segundo turno das eleições, ainda tem mais quatro anos de mandato no Senado.
Registrado em 2015, o Partido Novo participa de sua segundo eleição e já conquista o governo do segundo maior colégio eleitoral do paÃs. Em 2016, o partido elegeu somente quatro vereadores. Neste ano, além de Zema, foram eleitos oito deputados federais, 11 estaduais e um distrital.
O Novo não faz coligação com outros partidos e não usa verba pública para campanha. Para o cientista polÃtico Malco Camargos, da PUC-MG, Minas será a vitrine de um partido de pouca expressão e penetração nacional. “A eleição em Minas terá papel fundamental na polÃtica nacional no sentido de revelar a capacidade da gestão da polÃtica feita de fora da polÃtica, num estilo de pensar polÃticas públicas muito diferente do que é a prática.”
Zema aceitou entrar na polÃtica após ter recusado dois convites do Novo. “Se nós, que temos ética e alguma competência, não contribuirmos, o que está aà vai continuar acontecendo”, afirmou.
Natural de Araxá, no Triângulo Mineiro, Zema herdou os negócios do avô e multiplicou a rede de lojas de eletrodomésticos, móveis, vestuário, postos de combustÃveis, concessionárias e financeiras.
Divorciado e pai de dois filhos, ele acumula patrimônio de quase R$ 70 milhões e promete morar em uma casa comum, não do Palácio das Mangabeiras, residência oficial do governador.
Zema assumiu o controle do grupo familiar em 1991 e permaneceu na presidência até 2016, quando o comando foi passado, pela primeira vez, a uma pessoa que não é da famÃlia. O empresário, então, passou a presidir o Conselho Administrativo, formado pelos principais acionistas. No inÃcio de 2018, ao se filiar ao Partido Novo, se afastou definitivamente da gestão. O irmão, Romero Zema, ficou com a tarefa.
O Grupo Zema foi fundado em 1923 e fatura R$ 4,4 bilhões ao ano. São 800 pontos de venda em dez estados, com 5.300 empregados diretos.
Em 1999, o governador eleito, seu irmão e seu pai se filiaram ao antigo PL, partido que hoje é o PR, integrante do chamado centrão e que deu sustentação ao governo do PT tanto em Minas como na Presidência. Zema afirma que nunca teve atividade polÃtica e que nem se lembrava da filiação, feita para ajudar um amigo.
Sem experiência em gestão pública, Zema terá que administrar um déficit orçamentário de R$ 11,4 bilhões previsto para 2019. Durante a campanha, afirmou que sua prioridade será normalizar o pagamento de salário ao funcionalismo e de repasses constitucionais às prefeituras, que estão atrasados.
A equipe econômica de Zema será montada pelo economista Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central e um dos idealizadores do Plano Real. Não está descartado que o próprio assuma a Fazenda.
O principal conselheiro, vereador Mateus Simões (Novo), e o vice, Paulo Brant, também já buscam nomes para o governo.
As chaves para enfrentar a crise fiscal são corte radical de gastos e de cargos de indicação polÃtica, renegociação da dÃvida com a União e atração de empresas para gerar arrecadação.
Com apenas três deputados do Novo na Assembleia, Zema terá dificuldade em aprovar propostas, mas aposta no bom senso dos parlamentares. “As urnas já sinalizaram, e eles estão atentos, que a população quer mudança. Se alguém se negar a contribuir, vai estar se condenando para a próxima eleição, porque vou deixar muito claro que aquela pessoa está ali por interesse próprio.”
Zema foi eleito com a defesa da plataforma liberal e antipolÃtica do Novo, que prega menos intervenção do estado. Ele prometeu acabar com privilégios de polÃticos e servidores, simplificar tributos, montar um secretariado técnico, acabar com balcão de negócios e corrupção, buscar a iniciativa privada para ampliar serviços de saúde e educação, além de valorizar as empresas estatais para talvez privatizá-las.
O que impulsionou o empresário nas urnas, no entanto, foi a onda Jair Bolsonaro (PSL). Zema pediu votos ao capitão reformado em rede nacional e criticou as gestões petistas no Planalto. Bolsonaro, porém, se manteve neutro na disputa em Minas.
No primeiro turno, Zema teve apenas seis segundos no horário eleitoral e percorreu 200 cidades. A chegada ao segundo turno de forma surpreendente, já que as pesquisas o colocavam em terceiro até a reta final, fez com que ele ampliasse o contato com entidades, instituições e representantes de classes, adequando e amenizando seu plano de governo.
O empresário arrecadou R$ 4 milhões para a campanha, sendo R$ 1 milhão do Novo, R$ 235 mil do próprio bolso e boa parte de empresários —os que mais doaram foram o dono da Localiza, com R$ 700 mil, e o presidente da Rima Industrial, com R$ 300 mil. O maior gasto registrado até agora foi com empresa do marqueteiro Leandro Grôppo, R$ 500 mil.
Já Anastasia gastou R$ 5,6 milhões só em produção de programas de TV. Com uma coligação de 12 partidos, ele tinha três minutos e vinte segundos no horário eleitoral. O total arrecadado foi de R$ 12,5 milhões —cerca de 60% veio de verbas públicas.
Em debates e nas propagandas, Anastasia pediu aos eleitores que comparassem as trajetórias dos candidatos e apontou contradições de Zema, mas não foi suficiente para parar o discurso de que “os mesmos polÃticos de sempre já tiveram oportunidade e não fizeram”.
Anastasia não pensava em concorrer, mas Geraldo Alckmin (PSDB) precisava de palanque em Minas.
O senador insistiu que é um polÃtico técnico, que não tem parentes polÃticos e nem enriqueceu com isso –declarou patrimônio de R$ 1,3 milhão. “Não deixe que a raiva com a polÃtica prevaleça sobre seu bom julgamento, é preciso separar bons e maus polÃticos”, pediu.
Mas a imagem de afilhado de Aécio Neves (PSDB), também senador e ex-governador, lhe perseguiu. Marcado por denúncia de corrupção, Aécio se elegeu deputado, mas fez campanha escondido e foi xingado ao votar em Belo Horizonte. Depois de governar o estado de 2003 a 2014, os tucanos não conseguiram retomar o posto.
Esta eleição marca também a derrocada do PT em Minas, que chegou ao poder pela primeira vez com Fernando Pimentel em 2014, e teve uma gestão marcada por acusações de corrupção e crise econômica. O governador terminou em terceiro com 23% dos votos. A ex-presidente Dilma Rousseff (PT), ao retomar a origem mineira e tentar se eleger senadora, também não teve o aval das urnas.
O sucesso de Zema não está em suas bandeiras e propostas, explica Camargos. “O que o eleitor mineiro mostra com clareza é o desgaste em relação aos partidos tradicionais. No primeiro turno, tirou o PT. No segundo turno, tira o PSDB. O futuro desses partidos vai depender do sucesso ou não dessa proposta alternativa”, conclui.