Desde março deste ano, mais de 30 mil estudantes dos municípios de Serrinha, Barrocas, Biritinga e Teofilândia deixaram de comer proteína animal e seus derivados na alimentação escolar. Um Termo de Ajustamento de Conduta, conhecido como “TAC Vegano”, foi assinado entre o Ministério Público e as prefeituras para que o cardápio da rede pública de ensino fosse “mais saudável, sustentável e econômica”. No entanto, essa nova conduta vai atingir diretamente o repasse de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) aos municípios.
Para que as prefeituras recebam os recursos, elas precisam cumprir as determinações legais do Plano Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) como o planejamento do cardápio, que obriga “utilização de gêneros alimentícios básicos, de modo a respeitar as referências nutricionais, os hábitos alimentares, a cultura alimentar da localidade e pautar-se na sustentabilidade, sazonalidade e diversificação agrícola da região e na alimentação saudável e adequada.”
Ainda determina que as preparações tenham “10% (dez por cento) da energia total proveniente de açúcar simples adicionado; 15 a 30% (quinze a trinta por cento) da energia total proveniente de gorduras totais; 10% (dez por cento) da energia total proveniente de gordura saturada; 1% (um por cento) da energia total proveniente de gordura trans; 400 mg (quatrocentos miligramas) de sódio per capita, em período parcial, quando ofertada uma refeição; 600 mg (seiscentos miligramas) de sódio per capita, em período parcial, quando ofertadas duas refeições; e 1.400 mg (mil e quatrocentos miligramas) de sódio per capita, em período integral, quando ofertadas três ou mais refeições.”
No cardápio oferecido depois do TAC Vegano não consta carnes de gado (servidas como charque junto com feijão ou moídas), de carneiro, aves, peixes, ovos, leite de vaca e manteiga. Deveriam ser substituídos por carne de soja, o leite de arroz, a pasta de amendoim (no lugar da manteiga), legumes, verduras, raízes, frutas, grãos e pão integral. Contudo, essa nova variedade não está sendo cumprida por todas as prefeituras, já que alguns dos produtos são mais caros.
O FNDE questionou a competência do Ministério Público da Bahia para firmar o TAC retirando a proteína animal da alimentação “contrariando os preceitos dispostos na legislação federal ao retirar, ao mesmo tempo, do direito dos estudantes que possuem a cultura, o hábito e o gosto de consumir produtos de origem animal dos acesso a esses alimentos”, conforme documento encaminhado às prefeituras.
Em nota enviada ao BNews, o Ministério da Educação, através do FNDE, informou que os termos do TAC não estão de acordo com a legislação do PNAE e os municípios que não estiverem cumprindo-os terão os recursos suspensos.
Ainda em nota, a pasta afirma que tomou conhecimento do TAC em 5 de dezembro de 2017 e logo emitiu parecer com posicionamento do Conselho Federal de Nutricionistas que “não recomenda a retirada de produtos de origem animal da alimentação escolar”.
“Cabe ressaltar o disposto no artigo 44 da Resolução do Conselho Deliberativo – CD/FNDE n.º 26, de 17 de junho de 2013: “a prestação de contas a ser realizada pela [Entidade Executora] EEx., conforme Resolução nº 2, de 18 de janeiro de 2012 e suas alterações, consiste na comprovação do atingimento do objeto e do objetivo do Programa, quanto aos recursos financeiros repassados de cada exercício e ao cumprimento dos aspectos técnicos”. Quanto à possível sanção, de acordo com o inciso V do artigo 41 do mesmo normativo, “é facultado ao FNDE suspender o repasse dos recursos do PNAE quando os Estados, o Distrito Federal e os Municípios: (…) V – não obtiverem a aprovação da prestação de contas pelo FNDE”.
Recursos
Sem saberem o que fazer, os municípios que assinaram o TAC estão temerosos com a perda dos recursos. Atualmente, o valor repassado pela União a estados e municípios por dia letivo para cada aluno é definido de acordo com a etapa e modalidade de ensino:
– Creches: R$ 1,07
– Pré-escola: R$ 0,53
– Escolas indígenas e quilombolas: R$ 0,64
– Ensino fundamental e médio: R$ 0,36
– Educação de jovens e adultos: R$ 0,32
– Ensino integral: R$ 1,07
– Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral: R$ 2,00
– Alunos que frequentam o Atendimento Educacional Especializado no contraturno: R$ 0,53
A reportagem entrou em contato com o Ministério Público da Bahia desde o dia 11 de setembro. Após diversos contatos, com pedidos de reencaminhamento das questões, a ascom do órgão não respondeu mais à reportagem até o fechamento desta matéria. Dentre os questionamentos estão: o MP conhecia as determinações do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) de manter proteínas na alimentação escolar antes de assinar o TAC?; o Ministério da Educação encaminhou carta aos prefeitos lembrando que a não execução do programa com as legislações pertinentes causa a suspensão dos repasses. A partir disso, o MP pretende refazer ou anular o TAC?; ao assinarem o TAC, as prefeituras ficaram responsáveis por substituírem a proteína animal e derivados, por outra compensação de proteína, para que cumprissem as regras do PNAE?.