Na contramão de diversas regiões do Brasil e de outros países da América Latina, a Bahia registrou redução nos números relacionados a violência doméstica. Segundo a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA), a Central de Atendimento à Mulher (180) recebeu 247.021 ligações, de março a 15 de abril, deste ano, sendo 11.607 a menos que o mesmo período do ano de 2019. Nas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, localizadas em todo o território baiano, foram registradas 2.535 denúncias, entre 1º de março e 26 de abril, já em 2019 esse número subiu para 4.604, informou a Polícia Civil (PC).
No entanto, com o confinamento por causa da pandemia do coronavírus, organizações, que trabalham no combate a violência de gênero, apontam um cenário diferente das assessorias das polícias baianas e chamam atenção para a subnotificação do crime.
“Infelizmente as mulheres não estão conseguindo acessar os equipamentos de enfretamento da violência contra a mulher. Muitas estão confinadas com agressores, estão sendo impedidas de sair de casa e romper o ciclo da violência, então esses números não são reais”, disse a advogada e idealizadora da Tamo Juntas, Laina Crisóstomo.
Ao BNews, fontes relataram alguns casos de violência doméstica que elas testemunharam, durante o período da quarentena, na capital baiana. Confira a abaixo:
“O marido traiu a mulher e quer ficar com a amante, aí ele está ameaçando botar a esposa para fora de casa, dizendo que quando ela for trabalhar vai trocar as fechaduras”, disse uma.
“Elas tiveram outro caso de agressão antes da quarentena, depois disso “nunca mais” nada físico. Só que agora elas brigaram por ciúmes e a pessoa que mora com elas ouviu os gritos, quarto revirado, celular, ventilador, tudo quebrado, uma delas cheias de arranhões profundos. Elas se isolaram no quarto e agora não interagem nem com a colega da casa”, contou outra fonte.
Aumento das solicitações de vítimas de violência doméstica
Há três anos à frente da Tamo Juntas – iniciativa de advogadas que prestam assessoria jurídica gratuita para mulheres –, Laina contou que desde o início da quarentena os pedidos de ajuda “dispararam”. “Antes tínhamos uma média de três, no máximo cinco mensagens, a cada dois dias mais ou menos, agora a gente tem recebido entre 15 e 30 pedidos de ajuda”, completou.
Além disso, estar entre quatro paredes, convivendo diariamente com o agressor, com recomendações de isolamento e distanciamento social, também podem proporcionar situações de agressividade, seja psicológica ou física , de acordo com a defensora pública e membro do Núcleo de Defesa das Mulheres (Nudem) da Defensoria, Lívia Almeida.
Ela ainda ressaltou que o medo de procurar ajuda e a dificuldade de acessar as plataformas de enfrentamento a violência de gênero, também contribuem para a subnotificação dos casos.
Enfrentamento
Com dificuldades de registrar denúncias nos órgãos competentes, a desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) e presidente da Coordenadoria da Mulher, Nágila Brito, deu dicas de como solicitar ajuda a “terceiros”. “Quando for ao supermercado ou farmácia ou se de alguma forma conseguir entrar em contato com algum amigo ou parente, aliás esse é um aconselhamento, manter relações com quem possa rapidamente acionar a polícia para ajudar, pode ser o envio de uma palavra como SOS ou mesmo socorro”.
Para o BNews, a advogada, Laina Crisóstomo, ainda chama atenção para aqueles que não sofrem a violência doméstica, mas que por vezes dão conta de algum relato ou escutam brigas de vizinhos, amigos, conhecidos.
“Não é briga de casal, é violência doméstica, precisa ser denunciado, a gente pode ligar para o 180, para que isso não termine em feminícidio. A gente precisa fortalecer essas mulheres, mostrar que não parou, que não cessou por causa da pandemia, pelo contrário, a gente está cada vez mais encorajando elas a denunciarem justamente porque a gente entende que temos que sair dessa pandemia viva, a gente não pode morrer nem de Covid-19, nem de violência de gênero”, disse.