A posse do ministro Luís Roberto Barroso no comando do STF (Supremo Tribunal Federal) em outubro deste ano deve levar a corte ainda mais para o centro do debate político e ampliar o desgaste do tribunal.
O magistrado, que gosta dos holofotes e costuma dar entrevistas e comentar acontecimentos do país, assumirá o lugar da ministra Rosa Weber, que tem perfil discreto e evita dar declarações públicas longe do plenário em julgamentos.
O temor entre ministros em conversas reservadas é que o Supremo fique ainda mais exposto e a figura de Barroso na presidência reforce o discurso da militância do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de que o STF é um ator político que vai além de suas atribuições de última instância do Poder Judiciário.
Recentemente, o ministro se envolveu em polêmica ao se incluir entre os responsáveis por derrotar Bolsonaro nas eleições do ano passado.
“Nós derrotamos a censura, nós derrotamos a tortura, nós derrotamos o bolsonarismo para permitir a democracia e a manifestação livre de todas as pessoas”, afirmou no último dia 12 em evento da UNE (União Nacional dos Estudantes).
Apesar de a declaração ter ampliado o desgaste do Supremo e inserido a corte nos atritos políticos, o ministro fez movimentos internos no sentido contrário, a fim de apaziguar ânimos no tribunal.
No auge da Lava Jato, o STF viveu um racha poucas vezes visto. O tribunal se dividiu entre os defensores e os críticos da operação, e julgamentos sobre o tema expuseram brigas que, geralmente, ficavam restritas aos bastidores.
Barroso protagonizou entreveros com outros integrantes da corte, como Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. O primeiro já se aposentou e com o segundo ele fez um movimento de reconciliação.
A reaproximação começou na pandemia da Covid-19, quando Bolsonaro elevou o tom contra o tribunal e os ministros deixaram as diferenças de lado para se unir na defesa da atuação do Supremo.
Neste ano, em mais uma prova de que não só fizeram as pazes, como têm andado em sintonia, tomaram uma iniciativa inédita e assinaram em conjunto o voto sobre o piso nacional da enfermagem.
A iniciativa do ministro faz parte da estratégia de criar um ambiente propício para que consiga impor sua agenda e deixar um legado após os dois anos de mandato à frente do tribunal.
Gilmar é o decano do Supremo e um dos ministros com maior capacidade de articulação da corte. Na gestão do ministro Luiz Fux, por exemplo, Gilmar foi um dos principais empecilhos para Fux conseguir aprovar as mudanças internas que desejava.
Rosa teve que assumir o comando da corte para destravar os projetos sonhados por seu antecessor. O perfil de quem sempre se manteve distante das vaidades que movem as disputas internas da corte levou Rosa a ter uma gestão de mais êxito por ter implementado mudanças estruturais no tribunal.
Foi na gestão dela que o Supremo mudou o regimento interno para resolver dois grandes problemas da corte: o excesso de decisões individuais e os pedidos de vista (mais tempo para analisar o processo) sem prazo para ser devolvido. Ambas as medidas foram regulamentadas e restringidas.
Barroso não tem a mesma linha de atuação de Rosa, mas tem buscado pacificação interna antes mesmo de assumir a presidência.
Um dos temas que o magistrado deve abraçar é a defesa da preservação do meio ambiente. O ministro ainda aguarda os dois últimos meses de gestão de Rosa para definir a pauta que levará ao plenário da corte.
A ministra deve pautar dois dos processos mais sensíveis em curso no tribunal para análise do plenário em agosto: descriminalização das drogas e o marco temporal para demarcação de terras indígenas.
Caso os dois julgamentos não sejam concluídos por pedidos de vista, caberá a Barroso escolher o momento correto para levar à análise dos colegas as ações que têm potencial para acirrar os ânimos com o Congresso.
Esse, aliás, é outro temor de alguns ministros. Barroso sempre foi um defensor do papel “iluminista” do STF, ou seja, o papel de uma instituição que, às vezes, precisa ir além das decisões dos outros dois Poderes.
“O papel iluminista deve ser exercido com grande parcimônia e autocontenção, em conjunturas nas quais é preciso empurrar a história. Em alguns momentos cruciais do processo civilizatório, a razão humanista precisa impor-se sobre o senso comum majoritário”, escreveu o ministro em 2018 em artigo publicado na Folha.
Uma das marcas que Barroso pretende deixar é a ampliação da transparência do plenário virtual. Uma das medidas é facilitar, por exemplo, a exibição das sustentações orais dos advogados no sistema público em que os ministros inserem seus votos.
O magistrado também pretende dar grande atenção ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça), apesar do desafio de assumir o órgão responsável por punição a manifestações políticas de juízes em meio à polêmica de suas declarações sobre ter derrotado Bolsonaro.
O ministro estuda maneiras de fazer com que o conselho trabalhe para reduzir a sobrecarga de processos em todos os tribunais do país.
O magistrado também quer dar atenção especial às ações de execução fiscal e ao pagamento de precatórios.
O ministro já começou a fazer reuniões com a equipe que o ajudará na presidência da corte. Para a secretaria-geral do tribunal, órgão interno voltado à atuação judicial na definição da pauta de julgamentos e distribuição de processos, ele escolheu Aline Osório, que ocupou cargo equivalente na gestão de Barroso no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Para a diretoria-geral, responsável pelas questões administrativas do STF, o escolhido foi Eduardo Toledo, que ocupou o mesmo posto nas gestões dos ministros Dias Toffoli e Cármen Lúcia.
Já na secretaria-geral do CNJ a indicada será Adriana Cruz, juíza de carreira que já teve em outros momentos o nome cotado para vaga no STF.