Uma maratona de quase três horas e meia de música encerrou, já no inÃcio da manhã deste domingo (15), a carreira de 25 anos do Rappa. Anunciada como “o último show”, a apresentação na Jeunesse Arena, no Rio, mostrou uma banda que perdeu a capacidade de se comunicar entre si, mas não com o público. O racha que, há um ano e meio, divide o quarteto em dois lados -de um, o vocalista Falcão; do outro, Xandão (guitarra), Lobato (teclados) e Lauro (baixo)- ficou novamente evidente no palco. O cantor não falou com os demais fundadores da banda em nenhum momento e, em mais de uma oportunidade, mandou recados cifrados (ou nem tanto) ao microfone. Entrando em cena à 1h40, em mais um de seus tÃpicos atrasos -um dos motivos da discordância entre seus integrantes-, O Rappa encontrou 13 mil fãs lotando a arena com expectativa suficiente para injetar energia nos músicos e deixar em segundo plano, ao menos inicialmente, à s turbulências. A abertura com “O Salto”, acompanhada de um trecho de “O Homem Amarelo” -duas favoritas dos fãs- fez o público pular e cantar. “Que vibe”, reagiu Falcão, lendo em seguida o nome de cada estado do paÃs e de sua respectiva capital (mais o DF), para agradecer aos fãs espalhados Brasil afora. O extenso repertório misturou 32 canções de perÃodos distintos, apesar de ter ignorado o primeiro disco da banda (“O Rappa”, 1994). Sucessos antigos como “Hey Joe” e “Tumulto” apareceram ao lado de outros mais recentes, como “Anjos”. O show teve também momentos inusitados, como uma versão de “Ainda É Cedo”, da Legião Urbana, que Falcão levou sozinho na guitarra, e uma miniapresentação de Chino e Geninho, rappers do grupo Oriente, convidados ao palco pelo vocalista -eles cantaram “Linda, Louca e Mimada” e “O Vagabundo e a Dama”. Sustentáculo do show, o público criou os melhores momentos, como quando se apropriou da versão de “Súplica Cearense” (de Gordurinha e Nelinho), puxou balões de corações vermelhos em “Intervalo entre Carros” (que Falcão dedicou à s mulheres) e transformou a arena num céu estrelado, usando os celulares durante “
Falcão conversou com os fãs diversas vezes, agradecendo pela presença e pelo apoio ao longo da carreira do Rappa. Chegou a descer para cantar no meio da plateia da área VIP, cercado de seguranças.
Também homenageou nominalmente Marielle Franco (que ele chamou de Marcele, e depois corrigiu) e o motorista Anderson Gomes -o assassinato da vereadora (PSOL-RJ) e de seu motorista completou um mês na noite de sábado (14).
Se dialogou com o público, o vocalista ignorou seus colegas (com exceção do DJ Negralha), e a falta de comunicação entre o quarteto cobrou seu preço na fluidez e na espontaneidade do show.
Outrora uma banda que improvisava e criava junto à medida que tocava, não raro com resultados surpreendentes, O Rappa acabou como um grupo que segue o que o vocalista dita -Falcão decide na hora quais músicas serão tocadas, em que ordem e por quanto tempo; o resto da banda só tenta segui-lo, às vezes atabalhoadamente.
Essa lógica só se inverteu no final do show, após uma sequência particularmente enérgica com “Reza Vela” e “Tumulto”. Quando o cantor ia puxar “Anjos”, foi surpreendido pela banda atacando com “Ilê Ayê”. “Gostei, gostei”, reagiu Falcão, cantando com gosto uma das versões mais conhecidas do Rappa.
Na sequência, finalmente apresentou “Anjos”, dando a impressão de que a apresentação se encerraria ali. Mas havia tempo para mais uma: uma versão tosca de “Minha Alma”, um dos maiores hits da banda, executada já sem Xandão no palco. Às 5h, os músicos saÃram do palco pela última vez. E, pelo clima que se viu, talvez para nunca mais voltar como banda.